Um pavor de profissionais e mães chamado Hipoglicemia: precisa oferecer fórmula infantil?

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Quando um bebê nasce inúmeras dúvidas nascem junto. Ele normalmente passa por diversos procedimentos no hospital e nem sempre os pais estão cientes do que e por que está sendo feito.

É fato que muitos procedimentos já têm novas recomendações, especialmente para evitar o uso rotineiro, fazendo uma avaliação individual da necessidade de sua realização, porém, em muitas maternidades brasileiras, ainda perpetuam muitas práticas já ultrapassadas e, até mesmo, não recomendadas.

Fonte: Pixnio

Na elaboração do plano de parto muitas delas aparecem e os pais ficam em dúvida das reais indicações ou não, então vamos falar de uma delas neste texto.

Hipo… o que?

Se você nunca ouviu falar em Hipoglicemia,

Fonte: Pixnio

existe uma grande chance que se

tiver um bebê vai ouvir este termo no hospital. Parece haver um pavor dos profissionais, muitas vezes transmitido às famílias de que o bebê apresente essa condição. E o que é isso?

Hipoglicemia nada mais é do que uma diminuição da quantidade normal de açúcar no sangue. Uma queda real e persistente de açúcar pode causar diversos problemas sendo, o mais grave, uma dificuldade da função cerebral, podendo ocorrer lesões devido à falta de energia para o adequado funcionamento.

A hipoglicemia pode acontecer com qualquer bebê, porém existem fatores de risco para seu aparecimento: mãe diabética, bebê PIG (pequeno para a idade gestacional), prematuros, filhos de mães subnutridas, dentre outros.

Como prevenir e evitar?

Fonte: Maxpixel

O começo da prevenção de problemas sempre começa por um bom acompanhamento pré-natal que poderá permitir uma gestação mais saudável e tranquila. Além disso, uma boa assistência durante o nascimento do bebê favorece à melhor adaptação fora do útero.

Assim que o bebê nasce, algumas práticas melhoram consideravelmente o prognóstico neonatal no que diz respeito à diminuição do risco de hipoglicemia: contato imediato pele a pele, amamentação na primeira hora de vida, alojamento conjunto mãe e bebê são os principais exemplos e mais fáceis de serem adotados. Essas mesmas práticas contribuem fortemente para a redução da mortalidade infantil e para o sucesso na amamentação.

Infelizmente em muitos hospitais ainda prevalecem práticas protocolares que separam mães e bebês em seus primeiros momentos de vida, seja para avaliações e procedimentos, seja bebês que são mantidos em berçários para monitoramento, o que prejudica o estabelecimento da amamentação, que é um grande fator de proteção para a hipoglicemia.

Ao adotar essas práticas prejudiciais, é possível que ocorra uma hipoglicemia iatrogênica e, ou para corrigir este fato, ou mesmo na intenção de prevenir a hipoglicemia, algumas instituições oferecem água glicosada ou leite artificial para os bebês.

Onde está o problema?

De acordo com Toma e Rea (2008):

“A preocupação com a hipoglicemia neonatal logo após o parto tem sido responsável por interrupção do aleitamento materno exclusivo em muitos hospitais devido ao uso de soro glicosado em recém-nascidos. No entanto, a hipoglicemia parece ser comum entre os mamíferos como um processo adaptativo e autolimitado, na medida em que os níveis de glicose acabam por aumentar espontaneamente em poucas horas. A amamentação precoce e exclusiva atende às necessidades dos recém-nascidos a termo, por isto desaconselha-se o uso de soro glicosado, água ou fórmula infantil que podem interferir no estabelecimento da amamentação e nos mecanismos metabólicos compensatórios do bebê. Recomenda-se que o monitoramento dos níveis glicêmicos seja realizado apenas nos recém-nascidos de risco ou com sintomas clínicos de hipoglicemia, uma vez que os exames de rotina em bebês saudáveis podem interferir negativamente na relação mãe/bebê e na amamentação.”

O bebês nascem normalmente cansados. Ou eles passaram por um processo de trabalho de parto que é naturalmente cansativo e estressante (e isso tem uma função de preparação para a vida extrauterina) ou eles nasceram por uma cirurgia que também tem sua carga de estresse e não permite toda a preparação e adaptabilidade de um parto vaginal. De qualquer forma, é comum que esse bebê, algum tempo após nascer, sinta necessidade de dormir para repor as energias. Por essa razão, é comum uma hipoglicemia fisiológica ocorrer que não precisa de nenhuma intervenção tendo em vista que, em geral, o organismo será capaz de reequilibrar a glicose. Porém, para que isso aconteça é preciso que o bebê possa estabelecer rapidamente a amamentação, com o contato pele a pele e estímulo da ocitocina, permitindo, assim, a auto regulação.

Além disso, o uso desses alimentos chamados pré-lácteos (água glicosada e fórmula infantil ou leite artificial) podem causar lesões no intestino do recém-nascido que ainda é imaturo e não está preparado para a absorção e digestão correta desses alimentos.

Ainda não acabaram os problemas…

Outro grande fator é a dosagem que a forma como esses alimentos pré-lácteos podem ser oferecidos ao bebê. Em caso de real necessidade de suplementação alimentar isso deveria ser feito utilizando colher ou copinho, no entanto, ainda é comum os bebês receberem esses alimentos com o uso de uma chuquinha (pequena mamadeira para recém-nascidos).

Fonte: Pixabay

Neste caso temos outro fator que pode comprometer o aleitamento materno: a chamada confusão de bicos! Ou seja, o bebê recebe um alimento por meio de um bico artificial antes mesmo de ter aprendido a mamar corretamente no seio materno. Ao ser levado à mama, não consegue/não sabe como fazer a ordenha correta uma vez que o alimento da mamadeira sai muito mais facilmente, além de movimentar e estimular diferentemente os músculos oro-faciais. Isso causa irritabilidade no bebê que não consegue satisfazer sua fome, levando à nova complementação alimentar, o que gera um círculo vicioso prejudicial à amamentação.

Somado a isso, é comum ao ser ofertado o leite artificial a pessoa responsável diluir e oferecer ao bebê a dosagem mínima da medida do fabricante (em geral, 30 ml). Contudo, o estômago de um recém-nascido está preparado para receber cerca de 5 a 8 ml de leite. Assim, o estômago do bebê pode ficar dilatado, fazendo com que, ao ser levado ao seio materno, ele apresente uma demanda muito maior do que a demanda que o corpo da mãe está preparado para sanar. Novamente podemos ter o problema da dificuldade de saciedade, irritabilidade e o início do círculo vicioso que compromete o aleitamento materno.

Por que colocar isso no meu plano de parto?

 

Diversos estudos constataram haver ainda uma falta de atualização e adaptação dos serviços de saúde para boas, melhores e atuais práticas nos cuidados com os bebês recém-nascidos. Muitas vezes a desatualização ou mesmo a sobrecarga de trabalho/falta de profissionais e o receio de riscos aumentados de problemas com os bebês podem levar as equipes a adotarem práticas que causam problemas iatrogênicos, ou seja, problemas que acabam sendo causados pela má prática dos profissionais da assistência materno-infantil.

Por isso, é importante que os pais estejam atentos às reais necessidades de suplementação e, caso seja realmente necessária, à correta realização da mesma.

O que fazer?

  • Colocar o bebê para mamar o mais rápido possível após seu nascimento.
  • Manter o contato pele a pele para que ocorra a regulação da temperatura e o estímulo para que o bebê mame por meio do cheiro materno e produção de ocitocina, que vai contribuir para que o recém-nascido busque a mama e o leite seja ejetado do seio.
  • Evitar interferências na formação de vínculo mãe-bebê e promover a amamentação em livre demanda.
  • Priorizar maior oferta de leite materno antes de introduzir outros alimentos para o bebê.
  • Estimular amamentação mais frequente, especialmente para os bebês de maior risco para hipoglicemia.
  • Evitar uso de bicos artificiais em caso de necessidade de suplementação alimentar.
Fonte: Flávio Santos – Photography

Quer saber mais a respeito? Confira abaixo alguns estudos que serviram de base para este texto:

 

Avaliação Do Aleitamento Materno Em Crianças Atendidas Pela Unidade Básica De Saúde São Sebastião Em Juiz De Fora – MGhttp://www.ufjf.br/nates/files/2009/12/Aleitamento.pdf

Benefícios da Amamentação para a Saúde da Mulher e da Criança: um Ensaio sobre as Evidências. https://www.scielosp.org/scielo.php?pid=S0102-311X2008001400009&script=sci_arttext

Fatores Associados à introdução precoce de leite artificial, Município do Rio de Janeiro, 2007. https://www.scielosp.org/scielo.php?pid=S1415-790X2009000300013&script=sci_arttext&tlng=pt

Avaliação da Assistência ao Parto em Maternidade Terciária do interior do Estado de São Paulo, Brasil. https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/11947/S1519-38292009000100007.pdf?sequence=1&isAllowed=y

 Prevalência Do Aleitamento Materno Nos Primeiros Seis Meses De Vida. http://saudeinfantil.asic.pt/images/download-arquivo/1998%20-%203%20-%20Dezembro%20-%2020/rsi-1998-dezembro.pdf#page=55

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