A atuação da enfermeira obstetra/obstetriz, apesar do respaldo legal e capacitação profissional, ainda é pouco conhecida e cercada de preconceitos devido à dificuldade cultural e do sistema de saúde em romper com o modelo biomédico vigente.
Desde a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) na década de 1980, as políticas públicas na atenção à saúde da mulher visam à organização dos serviços de saúde no sentido de estabelecer programas para assistência obstétrica de qualidade e humanizada. Para tanto, a atenção à saúde da mulher exigia desde então ser conduzida por profissionais que fossem sensíveis e capacitados no seguimento do cuidado holístico e integral. À enfermeira obstetra/obstetriz cabia este papel.
A atuação
O acompanhamento à gestante de risco habitual (baixo risco) realizado pela enfermeira obstetra/obstetriz perpassa a verificação de dados vitais e alívio da agenda médica. Na atenção primária (unidade básica de saúde), a enfermeira tem papel fundamental na promoção à saúde e na prevenção de doenças na vida da mulher, da família e de toda a comunidade. Por meio de consulta de enfermagem, ações educativas e gestão da unidade de saúde, a enfermeira obstetra/obstetriz atua em educação perinatal preparando a mulher para ser protagonista do seu cuidado à saúde, que através da compreensão da fisiologia pode realizar as escolhas que envolvem a assistência do seu parto.
No passado, as mulheres pariam sob os cuidados de outras mulheres. Porém, desde que o parto passou a ser assistido em instituições hospitalares, ter um suporte contínuo passou a ser exceção, e consequentemente as mulheres ficaram expostas a intervenções obstétricas para adequar o processo fisiológico do parto às rotinas institucionais. Assim, o que parece promover segurança, as tecnologias utilizadas indevidamente e em excesso ocasionaram o aumento nos índices de cesáreas e de morbimortalidade materno-infantil.
Sendo o parto um evento fisiológico, a enfermeira obstetra/obstetriz está apta a planejar e realizar com autonomia a assistência ao parto fora da atenção hospitalar, em âmbito domiciliar, casa de parto e centro de parto normal. Pautada em diretrizes e protocolos de segurança, a assistência ao parto liderada por este profissional está associada (Resolução COFEN 516/2016:
“à melhoria dos indicadores de assistência e um dos pilares do processo de humanização do parto, contribuindo para o sucesso do parto normal e redução das intervenções. Referência em humanização do nascimento, o hospital mineiro Sophia Fieldman registrou uma drástica redução no número de episiotomias com realização de partos por enfermeiras obstétricas. O procedimento, que ocorria em 60% dos partos em 1992, é atualmente de 4%”.
As evidências científicas
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que haja no mínimo uma parteira qualificada para cada 125 nascimentos por ano e declara que sem os esforços governamentais para a capacitação e a valorização desses profissionais, a assistência ao parto continuará sendo medicalizada e a morbimortalidade materno-infantil não sofrerá redução. Uma pesquisa realizada pela Universidade de Oxford mostra que nenhum país conseguiu reduzir a morbimortalidade materno-infantil sem investir em enfermeiros (as) obstetras/obstetrizes. O Brasil está aquém de produzir tantos profissionais capacitados quanto necessário.
As evidências científicas demonstram que ter este profissional como suporte contínuo na assistência ao parto confere além da satisfação materna o benefício de ter uma experiência de parto mais positiva, diminui o uso de analgesia, o tempo de trabalho de parto, a probabilidade de ter depressão pós-parto, menor risco de ter Apgar (nota da vitalidade do bebê ao nascimento) baixo no quinto minuto e aumenta a probabilidade de ter parto natural.
O impacto da atuação
A enfermeira obstetra/obstetriz não só contribui para a redução de intervenções obstétricas desnecessárias, como o apoio emocional e encorajamento pode aprimorar o processo fisiológico do trabalho de parto e parto. Nesse sentido, a atuação da enfermeira obstetra/obstetriz causa um impacto positivo na atenção à saúde da mulher, pois resgata a importância do suporte contínuo na assistência obstétrica que respeita os direitos sexuais e reprodutivos, a fisiologia do parto e a autonomia da mulher.
Sendo assim, a enfermeira obstetra/obstetriz é mais que uma profissional que possui a arte do cuidar, é um importante recurso para garantir uma assistência digna e respeitosa ao parto.
Referências
- Atuação do enfermeiro no pré-natal:
- O papel das obstetrizes e enfermeiros obstetras:
NARCHI, Nádia Zanon; CRUZ, Elizabete Franco; GONCALVES, Roselane. O papel das obstetrizes e enfermeiras obstetras na promoção da maternidade segura no Brasil. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 18, n. 4, p. 1059-1068, Apr. 2013 . - Resolução COFEN 516/2016:
- Suporte contínuo:
Bohren MA, Hofmeyr GJ, Sakala C, Fukuzawa RK, Cuthbert A.
Continuous support for women during childbirth. - Modelo de cuidado liderado por obstetrizes versus outros modelos de assistência ao parto:
Sandall J, Soltani H, Gates S, Shennan A, Devane D.
Midwife-led continuity models versus other models of care for childbearing women.