“O puerpério inicia-se uma a duas horas após a saída da placenta e tem seu término imprevisto, pois enquanto a mulher amamentar ela estará sofrendo modificações da gestação (lactância), não retornando seus ciclos menstruais completamente à normalidade. Pode-se didaticamente dividir o puerpério em: imediato(1 ° ao 10° dia),tardio(11 ° ao 42° dia), e remoto(a partir do 43° dia). As transformações que se iniciam no puerpério, com a finalidade de restabelecer o organismo da mulher à situação não gravídica, ocorrem não somente nos aspectos endócrino e genital, mas no seu todo. A mulher neste momento, como em todos os outros,deve ser vista como um ser integral, não excluindo seu componente psíquico.” (2003, Ministério da Saúde)
No final da gravidez o nível de cortisol aumenta a fim de se preparar para a excitação emocional do parto. A medida que o corpo da mulher vai se auto ajustando após o parto o nível de cortisol diminui radicalmente – a baixa desse hormônio está vinculado à depressão. Mas, esse não é fator principal, há um conjunto de fatores associados (emocionais, psicológicos e hormonais).
Puerpério é um processo de desconstrução – o que a mulher era antes do filho não existe mais. É um momento de se reconstruir. Um re-conhecer a si mesma, se reformular com essa nova identidade – mãe. Um encontro profundo consigo mesma, um mergulho no escuro dessa nova etapa de sua vida. Uma imersão em si mesma, um misto de emoções – tudo junto e misturado -, momento de exaustão. Muda tudo o que se pensava antes …. uma nova forma de estar no mundo, de viver…
Como diz o psicólogo Alexandre Coimbra: “Seja bem vinda a nova você mesma.”
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Distúrbios de humor no puerpério
Na literatura são encontrados três distúrbios de humor no puerpério: disforia puerperal (baby blues), depressão pós-parto e psicose puerperal.
Baby blues tem incidência de 50% a 85% das novas mães (puérperas). Manifesta-se por volta de três a cinco dias do pós parto e pode persistir por em média duas semanas. Provavelmente acontece pela diminuição drástica dos hormônios após o parto (progesterona e estrógeno). Geralmente tem remissão espontânea. Caracteriza-se por choro fácil, humor instável, irritabilidade, falta de concentração, diminuição de apetite e dores de cabeça.
Geralmente, não é necessário uso de medicamentos – mas, deve-se ficar atento pois ela pode preceder um processo depressivo mais grave. O importante é escutar (sem julgar) e compreender essa mulher. Dar suporte emocional, ser a rede de apoio dela. Estar disponível e alerta.
Depressão pós parto tem incidência de 5% a 20% das puérperas. Manifesta-se por volta de duas semanas a três meses do pós parto. Caracteriza-se por choro fácil, apatia, alteração de sono, falta de energia e motivação, sentimento de culpa ou inutilidade, sentimento de desamparo e desesperança, dificuldade para se concentrar, agitação ou lentificação psicomotora, perda de vitalidade para estar em fusão com seu bebê e até mesmo pensamentos de morte ou suicídio. Percebe-se como sintoma anterior, a falta de harmonia nas interações – principalmente com o bebê.
O risco de ocorrer a depressão em uma nova gestação é de 30% a 50% – sendo que há estudos que apontam para 100%.
Geralmente é necessário o uso de antidepressivos, psicoterapia e total apoio a essa mulher no intuito de colaborar para a melhora da qualidade de interação entre ela e seu bebê.
Psicose pós parto tem incidência de 0,1% a 0,2% das puérperas. Pode ter início repentino entre a segunda e a terceira semana do pós parto. Caracteriza-se por insônia, alterações de humor, delírios e alucinações, comportamentos incomuns da mãe. Também é comum haver pensamentos de morte daquele bebê, inclusive pode manifestar a necessidade de matar o bebê. A recorrência em futura gestação é de 50%.
É um transtorno mais grave e menos comum, sendo quase sempre necessário que a mãe seja hospitalizada. Com o tratamento adequado pode ser resolvida em poucos meses.
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Importante lembrar que para muitas mulheres os sintomas permanecem por um período de tempo prolongado, enquanto para outras os sintomas podem aparecer tardiamente (durante o primeiro ano de vida do bebê).
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Assim que diagnosticado o quadro depressivo, é necessário que haja intervenção profissional (o mais breve possível) a fim de auxiliar e apoiar essa mulher. Também é de extrema importância a atuação preventiva de equipe multidisciplinar de saúde, para dar o apoio necessário para essa mulher enfrentar possíveis casos de depressão
Fatores de risco associados a depressão pós parto
Existem alguns fatores que aumentam a probabilidade de ocorrência da depressão no puerpério.
Fatores biológicos como: histórico de transtorno de humor ou ansiedade, de depressão pós parto, doença psiquiátrica na família, dentre outros.
Fatores psicossociais como: falta de suporte familiar e social, dificuldade financeira, gravidez não planejada, mãe solteira, parto difícil, violência doméstica ou conflitos no lar, desemprego, perda de familiares, bebê prematuro ou com problemas de saúde, violência obstétrica, dentre outros.
Depressão e interação mãe-bebê
Sabe-se que o estado depressivo da mãe pode influenciar negativamente no estabelecimento das primeiras interações com seu bebê e, consequentemente no desenvolvimento cognitivo, afetivo e social da criança. Mães depressivas tendem a olhar, tocar e falar menos com seus bebês. Como também tendem a parar de amamentar precocemente.
O bebê é capaz de captar as expressões do rosto da mãe (alegria, tristeza, raiva, inquietação, etc) e construir sua própria imagem através do que vê nela – como um espelho. Quando a mãe amamenta o seu bebê ela não está apenas o alimentando, além disso está sendo seu exemplo, onde o bebê irá se projetar e se construir.
Quando a mãe não consegue corresponder a essa comunicação primária com seu bebê, pode gerar uma disfunção nessa relação. Gerando por vezes implicações clínicas no bebê como: dificuldade no sono, não sorriso social, expressões faciais positivas em menor quantidade e muitas expressões faciais negativas, desviam o olhar ou não procuram o olhar da mãe, “cólica”, choro e, muitas vezes, ocorre o aumento da procura por atendimento médico. A mãe não consegue perceber que é imprescindível a manutenção das necessidades do seu bebê, de acolher o seu bebê e manter seu equilíbrio fisiológico.
Assim, bebês de mães depressivas mostram reduzida interação social e comportamentos menos adequados com a mãe e os demais. Mesmo diante destas circunstâncias, há estudos que mostram que crianças de maẽs depressivas podem ser resilientes, podendo melhorar as interações caso tenham bons parceiros para que isso ocorra.
O que você pode fazer por si mesma?
Pratique atividade física. Sim! Sei que nesse momento é difícil pensar nisso. Falta tempo e disposição. Mas, o exercício físico libera endorfina (hormônio responsável pela sensação de bem estar – “hormônio da felicidade”).
Encontre-se com outras mães. Dividir o que está sentindo, suas dificuldades e desejos com outras mães; trocar experiências com quem já passou ou está passando por uma situação parecida com a sua, pode trazer a sensação de pertencimento e a certeza de que não “é só comigo”. A maternidade pode ser bastante solitária não é mesmo? Vamos mudar esse fluxo!
Não se cobre demais e delegue funções, peça ajuda. Não precisamos dar conta de tudo sempre.
E saiba que ter depressão pós parto não quer dizer que você não é uma boa mãe ou fez algo errado. Nem mesmo que seu filho é indesejado. Há vários fatores -como os citados acima- que podem contribuir para desencadear a depressão.
Ainda que você nesse momento pense que não consegue fazer nada por você mesma, só de admitir que está deprimida e precisa de ajuda, você já deu o primeiro passo para sair da depressão.
Referências:
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher. Brasília: Ministério da Saúde, 2003. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cd04_13.pdf. Acesso em 20/02/2019.
CAMPOS, Bárbara Camila de; RODRIGUES, Olga Maria Piazentin Rolim. Depressão Pós-Parto Materna. Crenças, Práticas de Cuidado e Estimulação de Bebês no Primeiro Ano de Vida. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=5632989. Acesso em 20/02/2019.
CORDEIRO, Olga; SINTRA, Teresa. DISTÚRBIOS MENTAIS MATERNOS DO PÓS- PARTO. Disponível em: https://saudeinfantil.asic.pt/images/download-arquivo/1998%20-%201%20-%20Abril%20-%2020/rsi-1998-abril.pdf#page=27. Acesso em 20/02/2019.
FRIZZO, Giana Bitencourt; PICCININI, Cesar Augusto. INTERAÇÃO MÃE-BEBÊ EM CONTEXTO DE DEPRESSÃO MATERNA: ASPECTOS TEÓRICOS E EMPÍRICOS. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 10, n. 1, p. 47-55, jan./abr. 2005. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/%0D/pe/v10n1/v10n1a06.pdf. Acesso em 20/02/2019.
HARVEY, Erika. Depressão pós parto. Disponível em: https://books.google.com.br/books?hl=pt-BR&lr=&id=Msl7GBRArMgC&oi=fnd&pg=PA7&dq=diferen%C3%A7a+entre+babyblues+e++depresss%C3%A3o+pos+parto&ots=2Wq7fQMn7b&sig=wF6qtdPwiBax5CpDvwlZTFmjfgw#v=onepage&q&f=true . Acesso em 20/02/2019.
SCHWENGBER, Daniela Delias de Sousa; PICCININI, Cesar Augusto. O impacto da depressão pós-parto para a interação mãe-bebê. Estud. psicol. (Natal), Natal , v. 8, n. 3, p. 403-411. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-294X2003000300007&lang=pt. Acesso em 20/02/2019.