O parto domiciliar, ou parto em casa, é um direito da mulher e uma opção de local do parto para mulheres com baixo risco de complicações na gestação, ou risco habitual.
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O que dizem as evidências científicas?
O parto é um processo fisiológico e natural que pode ser vivenciado sem complicações pela maioria das mulheres e bebês. Contudo, estudos mostram que uma proporção considerável de mulheres grávidas saudáveis sofre pelo menos uma intervenção clínica durante o parto e são frequentemente submetidas a intervenções de rotina desnecessárias e potencialmente prejudiciais. Seus bebês também.
O parto mais científico costuma ser o menos tecnológico. Mas há uma confusão entre ciência e tecnologia: muitas pessoas acham que ser um médico científico significa fazer uso do máximo de tecnologia em cada paciente. Isso se torna perigoso! Ao analisarmos estudos científicos sobre o parto, compreendemos que muitas intervenções tecnológicas aumentam os riscos para mães e bebês, ao invés de diminuí-los.
Grandes estudos observacionais publicados reforçam as vantagens do parto domiciliar em relação ao parto hospitalar em termos de desfechos maternos, resultando em menor frequência de intervenções como episiotomia, analgesia, uso de ocitocina, operação cesariana e parto instrumental (fórceps e vácuo-extrator), sem aumento do risco de complicações para mães e bebês e com elevado grau de conforto e satisfação das mulheres que vivenciaram essa experiência única e transformadora em seu próprio lar. As taxas de mortalidade perinatal e neonatal são semelhantes àquelas observadas em partos hospitalares de baixo risco.
Apesar disso, a decisão final sobre o local do parto deve se basear tanto nas evidências científicas como nas características e expectativas das gestantes, bem como na experiência e qualificação dos profissionais da assistência e nas facilidades de acesso aos serviços de saúde.
Por que a polêmica em torno do parto em casa?
Tanto o Conselho Federal de Medicina (CFM) como a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) são contra o parto domiciliar. De acordo com estas entidades, o hospital é o local mais seguro para o parto, por oferecer infraestrutura e equipe treinada para lidar com intercorrências e emergências. Mesmo o Colégio Americano de Obstetrícia e Ginecologia (ACOG), que considera hospitais e centros de parto normal mais seguros, reconhece o direito das mulheres de escolher o local do parto. Entretanto, as evidências científicas disponíveis legitimam a segurança e os efeitos benéficos do parto em casa.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) e a Federação Internacional de Ginecologistas e Obstetras (FIGO) respeitam o direito de escolha do local do parto pelas mulheres e reconhecem que, quando assistido por profissionais habilitados, há benefícios consideráveis para as mulheres que querem e podem ter o parto domiciliar.
Essas divergências nos levam a questionar nosso atual modelo de assistência obstétrica, centrado no hospital e no médico, excessivamente tecnocrático e caracterizado pelas elevadas taxas de cesárea, de partos traumáticos e/ou com excesso de intervenções, e de prematuridade. Apesar da Política Nacional de Humanização preconizada pelo Ministério da Saúde, esse modelo ainda não permite assistência ao parto de forma humanizada e segura à maioria das mulheres. E mais, embora tenhamos 98% de partos hospitalares e a adoção indiscriminada da tecnologia para assistência ao parto, a mortalidade materna e neonatal persistem elevadas.
A concepção de que o parto é um processo perigoso e que precisa ser controlado para garantir um bom desfecho é ainda um discurso muito forte e defendido pelo sistema. Mesmo as evidências científicas comprovando que tentativas de controlar o parto estão sujeitas a riscos iatrogênicos reais e comumente resultam em uma cascata de intervenções, além de mais riscos para mães e bebês.
É na tentativa de fugir dessa triste realidade que muitas mulheres e famílias planejam o parto em casa, buscando vivenciar esse momento de forma mais cuidadosa, respeitosa, amorosa e prazerosa.
Parto domiciliar planejado
Apesar dos preconceitos, o parto domiciliar planejado é uma opção segura para gestantes de risco habitual acompanhadas por profissionais qualificados e experientes e que tenham um bom plano de transferência para um hospital caso necessário.
No Brasil, embora existam outros modelos, o mais difundido atualmente é a assistência ao parto em casa por parteiras (enfermeiras obstétricas e obstetrizes) nos grandes centros urbanos. São profissionais capacitadas para atender o parto normal, identificar as intercorrências, tomar decisões e prestar toda a assistência necessária até o encaminhamento adequado caso haja necessidade.
É preciso estar ciente de que existem riscos inerentes ao parto e, por isso, se preparar para possíveis emergências. O planejamento para o parto em casa começa com a escolha da equipe de assistência e segue durante todo o período gestacional. Ter um pré-natal bem feito garante que apenas as gestantes habilitadas continuem com este planejamento e elaborar plano de parto prevendo outras possibilidades, como a transferência, com referência médica e hospitalar caso haja necessidade também é importante, porque dá a dimensão dessa possibilidade e minimiza o seu impacto quando acontece.
Evidências científicas também apontam que a atuação da doula no cenário do parto pode trazer diversos benefícios significativos para as mulheres, seus bebês e família.
- Minimizar as dores durante o trabalho de parto;
- Melhorar a segurança física e emocional individual e familiar;
- Ajudar no desenvolvimento de habilidades subjetivas;
- Ampliar a quantidade e a qualidade de informações; e,
- Minimizar a possibilidade de intervenções durante o parto.
Todos esses são aspectos importantes do seu papel para proporcionar o bem-estar da mulher e sua maior satisfação com a experiência de parto.
A presença da doula é fundamental para a articulação entre equipe e família, sua atuação agrega potência ao trabalho em equipe e é capaz de propiciar à mulher mais segurança para que seja capaz de assumir o controle do seu processo de parir.
O parto em casa é uma busca, das gestantes e famílias, em direção à garantir o respeito ao direito de escolha da mulher de como e onde parir, um direito reprodutivo básico; garantir uma experiência de parto satisfatória, com mães e bebês saudáveis; e, aumentar a segurança na assistência ao parto, com um atendimento obstétrico de qualidade.
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Referências:
- Parto domiciliar: direito reprodutivo e evidências – Melania Amorim
- O parto mais científico costuma ser o parto menos tecnológico (em inglês) – Alice Dreger
- Parto, Aborto e Puerpério: Assistência Humanizada à Mulher – Ministério da Saúde
- Cadernos Humaniza SUS, volume 4: Humanização do parto e nascimento – Ministério da Saúde
- Parto domiciliar planejado: algumas coisas que talvez você não saiba – Ana Cris Duarte