Seu bebê tem poucas semanas de vida, mas possivelmente você já está preocupada com algo que acontecerá “daqui há meses”: o fim da licença maternidade. Talvez seja até cruel dizer que você deve pensar nisso logo, mas em uma realidade de apenas 4 meses de licença, se torna realmente necessário trazer esse assunto à tona o quanto antes. Afinal, é preciso planejar o retorno, com quem/onde o bebê ficará e, muito importante, como ficará o aleitamento materno – sim, é possível voltar ao trabalho e manter a amamentação, exclusiva até os seis meses e prolongada por até 1 ano ou mais.
Vamos tentar não criar muita ansiedade. Mais importante que tudo é aproveitar o tempo com o bebê, fortalecer o vínculo, aprender a conhecer esse serzinho que nem chegou e já mudou tanta coisa em você!
Porém, na hora de começar a refletir sobre fim da licença maternidade e retorno ao trabalho, talvez a primeira questão seja “como fazer”. Como deixar um bebê tão novo longe da mãe por hora, como manter o aleitamento materno (que deve ser exclusivo até os 6 meses, no mínimo), como não fazer uma introdução alimentar precoce, como trabalhar, efetivamente, sem deixar a cabeça lá no bebê?
Nesse post você vai encontrar
Corpo em um lugar, coração no outro
Bom, não deixar a cabeça no bebê é bem difícil. Independente se sua volta ao trabalho é desejada ou não (se não for, eu sinto muito, de coração, por você ter que voltar), você já não é mais a mesma, sua cabeça não tem as mesmas ocupações e preocupações de antes. São tantas descobertas em apenas poucos meses de bebê do lado de fora! No dia fatídico, a mãe vai para o trabalho como se deixasse o coração para trás, apenas o corpo está indo.
Ao retornar ao trabalho, algumas coisas são necessárias: planejamento é a principal delas. E algumas são muito desnecessárias: desmame, especialmente. Também não é preciso pensar em mamadeira, leite artificial nem alimentos, se ainda não for a hora para a Introdução Alimentar.
Você leu certo: não é preciso desmamar o seu bebê. Se você não pode levar o bebê com você, ou ir até ele para amamentar, é possível ordenhar o leite materno durante o trabalho e armazenar de forma adequada para transportar e, depois, ofertar ao bebê. Também é importante não oferecer o leite ordenhado em mamadeira – você pode usar o copinho de vidro, copo de bico rígido sem válvula ou colher dosadora – isso é importante para não haver confusão de bicos e, consequentemente, um desmame precoce.
Pode parecer complicado, mas não é. Possivelmente o grande problema está em ter o apoio das empresas nessa tarefa.
Antes mesmo de voltar ao trabalho é preciso começar o processo. Com uns 15 dias de antecedência já é possível começar a fazer um “estoque” de leite materno. Assim, garante a alimentação do bebê nos primeiros dias.
Para uma ordenha eficiente é preciso ter prática e regularidade. Estabeleça alguns horários para fazer isso e siga o mais à risca que você conseguir. Pode ser, por exemplo, enquanto seu bebê dormir o primeiro sono da noite ou durante os cochilos.
Não se preocupe, seu peito pode até parecer vazio, e talvez nas primeiras tentativas não saia quase nada. É preciso persistência. E lembre-se: peito é fábrica, não é estoque! 80% do leite é produzido durante a mamada (ou do estímulo da ordenha). Separe cerca de 30 minutos por vez, para ordenhar no máximo 15 minutos cada mama. Coma algo gostoso, beba água (inclusive, hidrate-se mais ao longo do dia). Mãos à obra!
Neste link, do blog do GVA – Grupo Virtual de Amamentação – você encontrará uma série de links para te ajudar. Como ordenhar, como estocar, congelar e ofertar o leite materno etc.
No escritório, você precisará estabelecer intervalos regulares, diariamente, para retirar o leite. Isso é muito importante tanto para manter a produção alta, como para renovar o estoque. Se possível, faça uma ordenha a cada 3h.
Ah, antes do seu retorno, com uns 30 dias de antecedência, vá até o escritório e explique como funcionará a rotina de ordenhas e como a empresa pode te ajudar, fazendo de você uma funcionária – e uma mãe – mais feliz.
Será que a empresa vai ajudar?
Você só saberá a resposta se fizer essa pergunta, não é? E você pode se surpreender com a resposta. Vamos lá, anote aí tudo o que é possível conversar com seu empregador.
Para que as mulheres trabalhadoras consigam seguir a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Ministério da Saúde de amamentar por 2 anos ou mais, sendo exclusivamente no peito nos 6 primeiros meses, é fundamental que haja apoio dos empregadores após a licença maternidade.
Desde a Constituição Federal de 1988, mulheres empregadas com contrato de trabalho formal têm direito a alguns benefícios previstos em lei que podem ajudar no período de amamentação. Além disso, cada relação de trabalho pode ter benefícios próprios.
O apoio pode vir em forma de extensão da licença, aumentando o tempo de 4 para 6 meses e permitindo férias na sequência; de redução da carga-horária e/ou flexibilização de horários; ou mesmo permitir que a funcionária leve o bebê para o trabalho, para que seja amamentado. Oferecer um ambiente confortável e propício para fazer as ordenhas no local de trabalho, também é uma excelente forma de demonstrar suporte!
Talvez a forma mais simples de uma organização demonstrar apoio para a mulher que decide manter a amamentação está em oferecer horários realmente flexíveis. Ou mesmo a oportunidade de atuar alguns dias em home office. Dessa forma, a mãe pode ter uma jornada de trabalho reduzida (carga horária/dia) e, no caso do trabalho remoto, conseguir passar mais tempo com o bebê – ou até mesmo um dia inteiro, ou dois, ou três a mais na semana.
Além disso, pode-se pensar em um espaço para a mulher ordenhar seu leite no ambiente de trabalho – uma sala simples, pequena, com uma cadeira ou poltrona, tomada e uma geladeira, que pode ser a mesma da copa, é o suficiente. Dessa forma, ela pode tirar o leite que será oferecido ao bebê durante sua ausência com o mínimo de conforto e muito mais higiene do que se fizesse isso no banheiro (infelizmente essa é a realidade da maioria das mães que voltam ao trabalho e decidem manter o aleitamento).
Os colegas de trabalho e os chefes diretos podem ajudar simplesmente não atrapalhando! A mulher terá horários mais ou menos fixos para fazer as ordenhas (isso é muito importante para a produção de leite). Que tal lembrar disso, ou perguntá-la ao invés de marcar aquela reunião no mesmo horário? Também é fundamental não achar que a mulher está com “folga de horário”, por tirar alguns períodos do dia para fazer a extração do leite! Lembre-se que ninguém questiona o tempo que um funcionário fumante gasta fora da sala por sair para alimentar seu vício.
Amamentar um bebê não é uma tarefa fácil. É necessário apoio, acolhimento e compreensão. Não só para o ato de amamentar, mas também para retornar ao trabalho e conciliar a vida profissional com a maternidade, caminhando para um equilíbrio possível, apesar de complexo. Quando a empresa, os chefes e colegas se dispõem a participar disso, a mulher só tem a ganhar, tanto como funcionária, quanto como mãe. E a empresa, claro, também.
No Brasil, é determinado por lei:
- Licença maternidade: a Constituição de 1988 garante para todas as mulheres trabalhadoras sob o regime CLT o direito a 120 dias de licença.
- Creche ou berçário: os estabelecimentos em que trabalham pelo menos 30 mulheres com mais de 16 anos de idade deverão ter local apropriado onde seja permitido às empregadas deixar, sob vigilância e assistência, os seus filhos durante a amamentação. É possível substituir por reembolso-creche ou convênio com entidades públicas ou privadas.
- Até o sexto mês de vida do bebê, a mulher tem direito a dois descansos especiais, de meia hora cada um, durante a jornada de trabalho, além dos intervalos normais para repouso e alimentação. É possível fazer um acordo e juntar os dois intervalos para que a mulher entre mais cedo ou saia mais tarde do trabalho.
- A critério médico, as pausas poderão ser ampliadas até após os 6 meses, quando a saúde do bebê exigir.
Lembre-se: bebês amamentados com leite materno possuem melhor resposta imunológica, ou seja, ficam menos doentes e se recuperam mais rapidamente. Com isso a mãe se ausentará menos do trabalho por doenças do bebê.
Voltar ao trabalho é mais um desafio no grande game de ser mãe. Um jogo difícil, prazeroso e turbulento! Espero que essas dicas a ajudem no planejamento.
Se quiser conversar comigo sobre esse assunto, ou sobre outros temas dentro de parto, pós-parto e amamentação, me chama no whatsapp ou mande um mail! Será um prazer te ajudar!
Abraços,
Rina Noronha – colomaterno.com
Informações importantes:
- Como fazer uma boa ordenha – vídeo (você pode seguir os mesmos passos para fazer ordenha manual ou mecânica – com bomba extratora)
- Qual a quantidade de leite que devo deixar para o meu bebê?
- Sobre tempo de congelamento do Leite Materno
Voltar ao trabalho e continuar amamentando funciona, sim:
Informações importantes e que podem te ajudar a conversar na empresa
- Impacto do incentivo ao aleitamento materno entre mulheres trabalhadoras formais
- Possibilidades e limitações da amamentação entre mulheres trabalhadoras formais
- Rede Global de Bancos de Leite Humano – Brasil
- Diretrizes do Ministério da Saúde sobre Aleitamento Materno
- Guia para implantação de salas de apoio à amamentação – Ministério da Saúde
- Mãe trabalhadora que amamenta – Cartilha do Ministério da Saúde
- CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas – artigos sobre amamentação e licença maternidade
- Pausas para amamentar durante a jornada: artigo 396, seção V
- Salário Maternidade integral: capítulo II, Artigo 7°, XVII
- Licença Maternidade: artigo 392, seção V
- Prorrogação por duas semanas da Licença Maternidade: artigo 392 seção V