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Feto morto: a contramão da maternidade

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Não era pra ser assim. Esse não foi o desfecho que você sonhou para sua gestação. Esse fim, agora, precisa ser um recomeço pra juntar forças, esperanças, tentar unir os pedaços pra entender esse quebra-cabeça-alma que bagunçou a sua vida. FÉto morto carrega um tanto da sua fé que está perdida e um tanto de você, que também morreu um pouco com a terrível notícia de que não tem mais um bebê ali dentro da barriga. Esse não foi um final feliz e não foi isso que te contaram sobre gravidez e maternidade. E aí começam as milhões de perguntas, não é mesmo? Por que aconteceu comigo? O que fiz de errado na gravidez? Será castigo? Por que perdi meu bebê?

Não acontece só com você

 Talvez você se sinta à deriva, mas saiba: pelo menos 15% das gestações podem terminar em perda, a maioria ocorrendo nos primeiros três meses de gravidez. Quando ocorre até 20º semana é considerada perda fetal precoce; entre 20 e 27 semanas, considera-se perda intermediária e, após esse período, denomina-se de perda tardia. Pesquisas realizadas apontam que, dentre as possíveis causas associadas às perdas perinatais (convenciona-se delimitar o período a partir da 22º semana gestacional ou feto morto acima de 500g), a hipertensão crônica com pré-eclâmpsia associada é a mais prevalente, principalmente na população brasileira. Ela desencadeia sofrimento fetal crônico, insuficiência placentária e atraso no crescimento intrauterino.  Outras razões para a ocorrência de feto morto são infecções como a sífilis e citomegalovírus, bem como desenvolvimento de diabetes gestacional e disfunção da tireoide maternos. Por isso a extrema importância de se fazer corretamente o pré-natal!

A explicação pode ser essa, mas continua doendo…

Dói muito… A existência de um feto morto no período gestacional frustra você e todos os profissionais que lutam pra que não aconteça nada de errado no ciclo gravídico-puerperal, pode acreditar! Mas é compreensível que suas perguntas não se esgotem, elas ajudam a elaborar o choque vivenciado e o vazio que se instalou na sua vida. Estava tudo plenamente preenchido e, como dizia Vinicius de Moraes, de repente, não mais que de repente, do riso fez-se o pranto (…), da calma fez-se o vento.

Fases do luto

Assim como um estado de choque, você poderá passar por muitas outras fases próprias do processo de luto: raiva, tristeza, negociações com o seu “Deus”, depressão, até se aproximar o momento de aceitar essa como sendo a sua história com o seu filho e sua família. E não importa quão curta o quão longa tenha sido a sua gestação, a sua dor é sua, é real, você já estava conectada com esse bebê, ele já tinha um lugar na sua nova vida, você tinha muitos planos pra ele, você tinha ele.

Por estes motivos, quando ocorre o óbito, recomenda-se que os pais possam segurar o bebê no colo, olhar seus detalhes e se despedir dele. É comum a mãe negar essa oferta feita por algum profissional da saúde, pois fica tudo muito embaralhado naquele instante. Então é possível, também, alguém registrar uma foto pra que os pais possam ver depois e, assim, evitar fantasias de que alguma outra coisa se sucedeu com o feto.

 

E como lidar com essa tormenta?

É provável que você vá ouvir muitas tentativas de consolo, como: “alguma coisa você vai aprender com isso”, “foi só uma fatalidade”, “Deus quis assim”, “logo você engravida de novo e tudo passa”. Nessas horas, use o seu guarda-chuva, se proteja do jeito que for melhor, pratique a surdez seletiva, ou seja, ouça o que der pra ouvir. É sério, as pessoas não sabem lidar com perdas, então, nos tenebrosos consolos que vão tentar te dar, a intenção delas é a melhor, mas não sabem como falar, entende?

Algumas mães preferem o silêncio, outras precisam falar até esgotar a dor.  De um jeito ou de outro, esse é um sofrimento que precisa de visibilidade, então aqui vão algumas dicas para lidar com esses dias ruins:

  • Chame o seu bebê pelo nome que você escolheu, ele existiu e sempre existirá na sua vida! E fale nele quantas vezes for necessário;
  • Alguns livros e sites abordam o tema com muita sensibilidade;
  • Respeite o seu tempo para decidir quando é melhor mexer nas roupinhas do bebê e em todas as coisas que já estavam preparadas para ele. Se preferir, faça uma caixa com fotos, roupas e presentes que já tinha ganhado;
  • Faça cartas para seu bebê com todas suas perguntas, seus porquês e seus sonhos. É como se você pudesse colocar cada ponto de interrogação em seu lugar;
  • Se a angústia apertar no peito e a dor parecer te engolir, busque ajuda especializada. Existem grupos de apoio ao luto e profissionais especializados que poderão te auxiliar;

É muito importante que esse filho seja incluído na história da sua vida, tudo será digerido no seu tempo. Por aqui, te deixo meu abraço apertado e o espaço aberto pra ler o seu relato!

Com carinho,

Camile da Rosa

 

Perda gestacional tardia

http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0006-59432007000100004&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt

Soneto da Separação

Moraes, Vinicius. Poemas, Sonetos e Baladas. São Paulo, Edições Gavetas, 1946

Causas de mortes fetais

https://seer.sis.puc-campinas.edu.br/seer/index.php/cienciasmedicas/article/viewFile/1363/1337

Fases do processo de luto

Kübler-Ross, E. (1992). Sobre a morte e o morrer: o que os doentes têm para ensinar a médicos, enfermeiras, religiosos e a seus próprios parentes. São Paulo: Martins Fontes.

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Doula Camile (Venâncio Aires-RS)

Psicóloga há 12 anos, apaixonada pela perinatalidade e parentalidade, formada doula em 2016 após um encontro irresistível com o mundo da humanização na minha segunda gravidez, um VBAC (parto vaginal após uma cesárea) super natural.Trabalho com orientação e apoio emocional durante o período gestacional e pós-parto, principalmente na prevenção da depressão pós-parto e fortalecimento para o aleitamento materno.Desejo que as mulheres tenham experiências felizes no nascimento de seus filhos e que seus desejos sejam respeitados. Para isso realizo orientação sobre o processo de parto, mudanças que ocorrem na maternidade e aspectos para o sucesso na amamentação.Cidade de atuação: Venâncio Aires/RSContato:  Instagram: @camilepsi  E-mail: camilepsi@gmail.com

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  • Lindo texto, só nós mães sabemos que dor é essa que te mata aos poucos de dentro para fora, é uma ferida que não cura, o tempo vai passando e a dor continua. Eu tive uma perda há 6 anos, aborto espontâneo, estava com 8 semanas de gestação, nunca saberei o sexo do meu bebê, nem pude sequer lhe dar um nome, hoje tenho dois meninos que são bençãos na minha vida, que amo mais que tudo, mas nada será capaz de apagar as marcas da perda, nenhum filho substitui o outro. 😢😢
    Sempre que penso nele (a), me pergunto qual seria o seu sexo, a idade que estaria hoje 💔 mas ao mesmo tempo penso que se ele (a) tivesse nascido eu não teria um dos filhos que tenho hoje, e isso me causa sofrimento, me faz sentir culpada por pensar desta forma. 😭😟

    • Querida Cristina, imagino como é doloroso ficar com tantos sonhos pendentes e imaginando o que poderia ter sido e não foi... Por isso é tão importante incluir esse filho nessa história e, mais adiante, deixar que seus outros filhos saibam do irmão(ã) que existe na história da família. Não se sinta culpada, é muita dor pra abraçar, não é? Daqui, te envio meu abraço virtual bem apertado!

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