Categories: Gravidez

Ambivalência Materna na Gestação

Compartilhe:

Para essa nossa conversa eu gostaria, antes de mais nada, de pedir que feche seus olhos e se lembre de todos os sentimentos experimentados por você, quando se soube grávida. E você pode ser bem sincera, porque ninguém está vendo ou ouvindo você agora. E durante a gestação, por tudo o que você já passou? O que mudou na sua vida após a gravidez?

Agora que você pensou daí e eu daqui, em tudo isso, podemos continuar.

 

Liquidificador de Sentimentos, eu?

Pixabay

Certa vez, estava coordenando um grupo de mães, e ao falarmos dos sentimentos envolvidos na maternidade, uma delas disse que se sentia em um grande liquidificador de sentimentos. Pensei, desde aquela época, e continuo pensando que esta imagem é tão apropriada, que me fica impossível pensar em qualquer outra.

São tantas as mudanças fisiológicas e psíquicas, que não é possível continuar a ser, exatamente, como se era, antes dos filhos. E hoje, ao falarmos sobre a maternidade real, já aceitamos dizer que nem tudo são flores na maternagem. Mas e durante a gestação? Como ficamos, em uma sociedade que ainda romantiza e idealiza o papel da mulher grávida? E que, além dessa romantização, temos e carregamos conosco, nossas próprias expectativas em relação ao parto, amamentação e parentalidade, nossas próprias idealizações, particulares e únicas e que, muitas vezes, nos impedem de olhar para nossas sombras. O que pode acabar gerando uma frustração ainda maior quando as coisas não saem como o esperado.

O fato é que, comumente, há muito mais entre as alegrias e exaltações da gestação, do que sonha nossa vã barriga cheia de vida.

 

O que é Ambivalência Afinal?

Pixabay

Ambivalência é um conceito que vem da psicologia, e foi cunhado por Bleuler, para falar de sentimentos opostos, que ocorrem ao mesmo tempo, por um mesmo estímulo ou pessoa. Mais claramente, falamos de amor e ódio.

Para a psicanálise, mais especificamente para Freud, a ambivalência de sentimentos, pode fazer parte de todas as relações humanas. E ao ouvirmos isso, somos capazes de aceitar que nossas relações sejam permeadas por estes sentimentos. Nos é possível pensar que, amamos nossos companheiros ou companheiras, e que, os odiamos por vezes. Nos permitimos sentir algo que, culturalmente, está relacionado à coisas negativas e ruins, a respeito de diversas pessoas em nossas vidas, mas nunca em relação aos filhos! Ainda mais aos que ainda sequer nasceram! Nunca em relação à maternidade que pressupõe um amor incondicional que nasce no momento em que nos sabemos grávidas. Como se ali, nascessemos como mães!

O que minha Gestação tem com isso?

Pixabay

Quando nos ofertamos a oportunidade de dizer para nós mesmas:

“Mesmo tendo planejado tanto essa gravidez, agora não me sinto plena e feliz como todos dizem que eu deveria estar”, “às vezes me arrependo de ter querido ser mãe” ou “se eu soubesse que seria assim, eu não teria engravidado”…

…dizer para nós mesmas e aceitarmos que podemos ter sentimentos não prazerosos na gestação. Que podemos não nos sentir plenas. Que podemos descobrir (já grávidas) que a gravidez não é como achávamos que seria, a culpa que poderia existir decorrente do não falar sobre esses sentimentos, pode ser trabalhada e entendida como um dado cultural talvez, que nos exige sermos de um jeito que não corresponde à nossa realidade. Tem aquelas que se sentem plenas e completamente felizes e sem dúvidas na gestação? Sim! Mas as que não se sentem assim, podem ser mais numerosas do que o que você pensa. E saber que está tudo bem duvidar de si mesma, ter momentos de arrependimento, de medo, de raiva, de ódio por não poder controlar os processos naturais do seu corpo, e sentir que está liberada para vivenciar tudo isso, pode ser libertador e muito, muito empoderador! Então, liberte-se, fale com quem quiser sobre seus sentimentos e viva sua gestação com  menos culpa, porque está tudo bem, e porque, no fim das contas, os sentimentos que você não gosta de sentir também são seus e fazem parte de quem você é e da mãe que é ou será.

Referências sobre o Assunto

  • BADINTER, E. Um Amor Conquistado: o mito do amor materno. Rio de Janeiro, Nova Fronteira., 1985.
  • FORNA, A. A Mãe de Todos os Mitos: como a sociedade modela e reprime as mães. Rio de Janeiro, Ediouro, 1999.
  • TETTAMANTI, A. Mãe e Filho: segredos de uma relação. São Paulo, Academia de Inteligência, 2008.
Compartilhe:
Doula Erika Novaes (SP)

Doula e educadora perinatal formada há 7 anos pelo Gama (Grupo de Apoio á Maternidade Ativa), ministro aulas em cursos de formação e oficinas. Coordeno grupos terapêuticos para profissionais do parto, além da atuação com doulagem de parto propriamente dita e consultoria gestacional. Também sou psicóloga e arteterapeuta formada pela Universidade Paulista (UNIP), especializada em perinatalidade e parentalidade pelo Instituto Gerar de Psicologia Perinatal e Parental. Atuo na área clínica com atendimento á gestantes, casais e puérperas, e coordeno grupos terapêuticos e oficinas criativas para famílias e profissionais da área da perinatalidade. Me interesso pelos temas que cercam os profissionais que trabalham com parturição, bem como por questões relacionadas à sexualidade materna. Sou mãe do amoroso Cauê, da Lola (estrela radiante no meu céu) e da sapeca Cora.

Recent Posts

Roda de conversa para pessoas grávidas

Buscar um parto normal humanizado pode ser bem solitário. Parece que um evento natural é…

7 meses ago

Filmes e séries para quem quer o parto normal

O parto normal é o processo mais natural e saudável para o nascimento de um…

1 ano ago

5 perfis valiosos para seguir no instagram

O parto normal é um tema que desperta muitas dúvidas e questionamentos nas gestantes e…

1 ano ago

Não foi como sonhei, mas foi tranquilo

Dia 28/01 sábado por volta as 18:30, comecei a ir ao banheiro fazer xixi e…

1 ano ago

Era meu sonho um VBAC, e consegui!

Minha dpp era 26/12, e eu já estava com consulta marcada pro dia 27 pronta…

1 ano ago

Foi o momento mais feliz da minha vida

Minhas contrações se intensificaram no dia 05/12 (sim no dia do jogo do Brasil contra…

1 ano ago