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Doula pra que te quero? A mulher por trás da Doula

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    Imagem do arquivo pessoal

Eu me chamo Daniela Oliveira Lopes, tenho 34 anos, sou graduada em administração em comércio exterior, casada, mãe da Melissa de 2 anos e 9 meses e Doula; exatamente nesta ordem. Eu sempre fui muito planejada, sim fui; hoje como mãe, nem tanto, rs…

Planejei estudar, trabalhar e pagar meus estudos na faculdade, me formar, trabalhar com algo que gostasse e ganhar algum dinheiro pra comprar uma casa e um dia me casar na igreja; de branco, com a pessoa que amo e construir uma família. Sonhos e objetivos de uma garota tradicional, típica de interior e de criação cristã católica.

Bem, graças a Deus tudo saiu como planejado até aí. Nasci e cresci em Tatuí, interior de SP, como a irmã caçula de uma família pequena, com meus pais, uma irmã, sobrinhos e alguns primos.

Ainda na adolescência conheci meu primeiro e único namorado e ao lado dele e com ele lutei para realizar meus planos, que se tornaram nossos planos e nossos sonhos. Namoramos por 10 anos e durante esses longos anos foi que consegui meu 1º emprego, me formei, comprei meu 1º carro, compramos nossa casa, ficamos noivos e ufa, enfim nos casamos, numa cerimônia linda e emocionante com direito a festa, viagem de lua de mel e tudo, como planejamos e sonhamos (e ralamos também).

Me tornei o que eu mais temia

Imagem do arquivo pessoal

Falando profissionalmente, eu acreditava que trabalhava com aquilo que amava, mas depois de mais de uma década trabalhando na mesma empresa, mesmo tendo buscado crescimento constante; cheguei num momento de crise existencial, onde não me identificava mais com aquilo que fazia. Eu sempre tive em mim um espírito generoso, motivador e inspirador, de buscar o novo e queria encontrar minha verdadeira missão e propósito de vida.

Desde de adolescente eu exerci trabalhos voluntários com crianças em orfanatos, idosos, doentes em hospitais, famílias e comunidades menos favorecidas, participando e promovendo grupos e campanhas de ação social e eu ainda sim algo me faltava; eu não estava mais encontrando meu papel na sociedade e queria fazer mais do que ser um número trazendo lucratividade à uma multinacional e voluntária de fim de semana.

Eu que não curtia muito esse papo de parto, não tinha muita relação com minha própria história de parto e nascimento, só sabia mesmo que havia nascido de parto normal, numa madrugada de inverno intenso numa maternidade precária de minha cidade. Eu que ouvi desde muito nova as experiências de parto sofridas e dolorosas e quem sabe até violentas da minha irmã mais velha, fugia o tempo todo desse tipo de assunto. Era tipo assim: política, futebol, religião e parto não se discutem! Quando alguém vinha com um relato então, tava eu correndo quilômetros de distância pra não ouvir.

Tola eu, estava mesmo era fugindo do meu relógio biológico e espiritual que estava me dizendo que após 3 anos de casamento, tinha algo faltando pra eu me reencontrar, como filha, como mulher, como mãe.

O que eu não entendia era que, o que me fazia fugir do assunto, da idéia, da decisão, da transformação de me tornar Mãe, era o Medo. O Aterrorizante medo do parto, do sofrimento, da dor, da violência obstétrica, medo do desconhecido, de toda transformação física, psicológica, espiritual e emocional que a maternidade me reservava. Mas eu e meu marido decidimos então, que era a hora sim de tentarmos engravidar e como uma boa planejadora na minha vida profissional e pessoal, tomei coragem e lá fomos nós planejar novamente.

E pra nossa surpresa, em 1 mês já estava lá nossa sementinha, eu estava em estado de graça, abençoada e gravidíssima e tendo agora de uma vez por todas que encarar cada um do meus medos.

Eu que até então nunca havia parado para estudar sobre o assunto gestação, parto, amamentação, eu tinha pavor de ouvir relatos e nem sabia o que era uma doula; em pouquíssimas semanas estava lá mergulhada no universo da humanização, apaixonada, empoderada e ativista do parto natural humanizado, com um desejo enorme de parir. Então com pouco mais de 12 semanas, assisti a minha primeira palestra de gestante, com uma enfermeira obstetra incrível, cujo tema era Parto Normal X Parto Cesárea, e ao final da palestra imagine que eu já estava com o contato dessa EO linda que atendia partos para planejar que ela estivesse comigo no meu parto.

Eu mal sabia quantas raízes cresciam dentro de mim, dessa sementinha que era meu bebê. E durante a minha gestação, estudei muito, li muito, busquei, investiguei, questionei, chorei e me decepcionei com a realidade do sistema atual; mas não desanimei e participei de cada encontro de gestante, li cada livro indicado, dos relatos de parto que eu tanto fugia, eu engolia um atrás do outro, rsrs… e meu amor, meu marido super parceiro, como sempre embarcou nessa comigo.

Grávidos, entendemos juntos os benefícios do parto normal e mais natural possível e sem intervenções ou com o mínimo possível. Compreendemos juntos o papel da Doula, sua importância, seu suporte, seu acolhimento e a cada informação, a cada leitura um medo meu era vencido e a busca pelo parto adequado tão sonhado só se fortalecia. Eu já nem me reconhecia, eu já não era mais a mesma.

Ocitocina: um propósito de vida

Já no final da gestação eu já era só gratidão! Eu curtia cada momento com meu barrigão, ah como eu amava crescer e como crescia esse meu coração, transbordava e ardia em mim uma vocação ainda desconhecida.

Minha gestação havia sido maravilhosa e abençoada até que então, chegou o grande dia e me lembro da conversa “super cabeça” que tive com minha EO enquanto estávamos “partejando” na área verde do hospital, em pleno trabalho de parto ativo; no intervalo entre uma contração e outra eu agradecia e me deslumbrava com a grandeza, a sabedoria e perfeição divina da natureza humana, da fisiologia do meu corpo, do poder do meu sagrado feminino, do que eu e minha filha éramos capazes.

Por Aline Baldassim
Por Aline Baldassim

 

 

 

 

 

 

 

 

Eu não sabia quantas horas ainda tínhamos pela frente em trabalho de parto e nem qual seria o desfecho do meu parto; mas em lágrimas eu já sentia que tinha valido a pena tudo que havia vivido até ali, todas minhas escolhas e decisões. Mas sentia que isso não era o bastante; pois a mulher que habitava em mim, ou melhor, a mulher que havia despertado em mim estava chorando por todas aquelas mulheres que não poderiam ter um parto respeitoso, uma experiência verdadeiramente humana, bela e de amor como todas merecem!

Eu chorava por todas que não tiveram um parto digno, pela minha irmã, pela minha mãe, pela minha avó… por todas as mulheres que se quer teriam alcance a toda informação valiosa que tive, por todas mulheres que se quer teriam o mínimo de respeito que eu tive. Meu peito ardia e se rasgava por dentro a cada contração, por todas as mulheres que ainda seriam vítimas do sistema obstétrico e teriam seus partos roubados, seus corpos violentados, seus sonhos negados.

Eu me sentia feliz e grata e ao mesmo tempo perturbada, culpada por ser privilegiada, pois todas mereciam e merecem igualmente a mim: o mesmo direito, o mesmo protagonismo e o mesmo respeito.

Eu não sabia se até o nascimento da minha filha eu também igualmente, não me tornaria mais uma estatística, mais uma vítima; mas foi por mim, pela minha filha e por elas, que eu me entreguei completamente ao meu parto, deixei fluir meu nível máximo de ocitocina e fui pra “partolândia”. E por mais serena que eu transparecesse, eu deixei toda minha força e instinto selvagem virem à tona e lutei até o final para trazer minha filha ao mundo por mim mesma.

Eu já estava transformada e sabia que não sairia mais a mesma após aquele parto.

Amor a primeira parida

Por Aline Baldassim

Então Graças a Deus e ao meu marido que esteve incrivelmente entregue e forte ao meu lado o tempo todo, não me deixou desistir, não soltou as minhas mãos, não deixou de me massagear e de me sustentar com seu corpo, por pouco mais de 11 horas de trabalho de parto…

Graças a minha EO que com todo seu conhecimento, sua ternura, suas massagens, seus aromas, suas sugestões pra eu ir pro chuveiro, seu olhar, suas palavras, suas técnicas não farmacológicas para alivio da dor, suas preces e sua fé em mim e todo o respaldo emocional e com estudos baseados em evidencias que tive durante a gestação…

E enfim graças a minha GO por todo incentivo, respeito e liberdade durante a gestação e também durante o trabalho de parto, por toda paciência, pelas massagens, por respeitar minhas escolhas e meus pedidos. Por ficar junto a minha EO no chão sustentando minhas pernas e sustentando o corpinho da Melissa ao nascer.

Gratidão imensa a todos que participaram da experiência incrível de parto que vivemos em especial a minha amiga pessoal e fotógrafa Aline Baldassim pelos registros incríveis desse momento sagrado.

E foi graças a essa experiência que me resinifiquei como mulher e após o nascimento tão amoroso e respeitoso da minha filha, eu queria gritar ao mundo que fui capaz e que todas são capazes! Eu queria fazer algo para ajudar de alguma maneira, todas que como eu tinham um medo enorme mas também um desejo enorme de parir, eu queria contar pra elas, que elas podem! Fazê-las acreditar em si mesmas, como eu acreditei!

Assim também passei meu puerpério, auxiliando futuras mamães, amigas, conhecidas e desconhecidas, casais; em rodas, encontros, danças, pic-nics, pracinhas, chás de bênçãos, empoderando, informando, estudando, lutando lado a lado, chorando, vibrando e sonhando junto, pintando barrigas, ensinando a carregar no sling… recebendo colo e dando colo, e buscando fazer crescer essa corrente de mulheres, mães, irmãs.

Eu já queria muito ser Doula, mas com minha filha pequena, nosso lar e a volta ao trabalho, mais as atividades voluntárias, me impossibilitavam… ainda não era a hora. Fui paciente e priorizei minha filha, mas continuei mergulhando, estudando, aprendendo e como autodidata, foi que tive a dádiva de assistir o primeiro parto da minha vida! Após 7 meses da experiência de parir eu vi a vida de outro ângulo! Vivenciei uma mulher parir lindamente e já no pré parto eu não pensava muito no que fazer e em como fazer algo por ela, eu apenas fazia… Era algo instintivo, era uma vocação, um chamado, uma conexão imediata, uma aptidão nata.

Imagem do arquivo pessoal
Imagem do arquivo pessoal

Daí em diante, eu já tinha certeza do que eu queria pra mim, eu já havia encontrado meu lugar e meu propósito de vida. Então no momento oportuno me aprimorei com cursos, estudos, workshops, congressos, grupos de gestantes e doulas, compartilhando experiências adquiridas nessa jornada de maternagem. Doando e recebendo, com a certeza de que nunca estamos sós e nunca devemos ficar sós.

Sei que essa caminhada está apenas no início, mas saber o caminho que eu nasci pra trilhar é o que me inspira todos os dias a dar mais um passo a frente!

“Tenho que gritar, tenho que arriscar, ai de mim se não o faço! Como escapar de Ti, como calar, se Tua voz arde em meu peito? Tenho que andar, tenho que lutar, ai de mim se não o faço! ” Trecho da música O Profeta – Comunidade Recado.

É o que me faz buscar ser alguém melhor e dar o meu melhor, por que é o mínimo que eu posso fazer, por mim e por alguém.

Referências Bibliográficas:

Livros: “Parto Ativo”Balaskas, Janet

Livro: ” Parto com Amor “Luciana Bennati, Marcelo Min

  • Medo da dor no parto

Livro: “Quando o corpo consente” Therese Bertherat, Marie

https://www.scielosp.org/article/csp/2018.v34n5/e00072818/

  • Trabalho de parto ativo                                                                                                       Livro: “Parto Ativo”Balaskas, Janet

  • O que é essa tal, Partolândia?
    https://www.partolandia.com.br/partolndia

https://estilo.uol.com.br/gravidez-e-filhos/noticias/redacao/2018/01/02/trabalho-de-parto-pode-conduzir-a-um-estado-de-consciencia-alterado.htm

 

 

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Doula Daniela Lopes (Porto-PT)

Mãe e Doula, minha formação acadêmica foi em Administração em Comércio Exterior. Quando engravidei minha vida tomou outro sentido ao mergulhar no universo da humanização, buscando com unhas e dentes meu parto normal humanizado. E assim recebi minha filha Melissa num parto natural, lindo, respeitoso e transformador.Ouvi ao chamado que ardia em meu coração e percebi que como doula, poderia mostrar às mulheres que elas podem e têm direito de vivenciar sua gestação e seu parto como sonham; com amor, informação e liberdade, tendo suas escolhas acolhidas e respeitadas.

Cidades de Atuação: Porto - Portugal

Instagram: @danidoula

Contato: lopes.danioliveira@gmail.com

View Comments

  • Dani, é lindo ler sobre sua trajetória, principalmente quando conheço de pertinho. Parabéns querida!

  • Dani o mundo da graça por vc sair de todo esse esquema e se doar a ajudar mulheres a ter seu tão sonhado parto humanizado !!! Vc veio para mudar o mundo mesmo que seja começando pelo mundo a sua volta !!! Parabéns pelas escolhas e decisões que tomou !!! MT sucesso nessa no a missão

    • Aí miga, é pra me fazer chorar mesmo neh?! Gratidão por confiar em mim e me motivar sempre 😍🙏💕

  • Amiga... acredite se quiser... tô chorando depois de ler esse relato. Que coisa mais linda!!!! Sua história é bênção do Senhor...é incentivadora e motivadores!!!! Vai firme e com fé nesse caminho...pq qdo uma luz se acende... ela precisa iluminar a todos.
    Parabéns!!! É obrigada por me deixar participar um pouquinho dessa linda história.

    • Ooo amiga! Eu que agradeço pela estar presente comigo na minha história de vida, com seu dom de luz tbem! 😍

  • Dani, não tem como não se emocionar com as lindas palavras saídas com certeza do seu coração.
    Seu texto levou -me a reflexão profunda, talvez se tivesse tido a oportunidade de lê-lo antes do meu parto, eu certamente teria coragem que me faltou, para tentar um parto normal.
    Parabéns pelo testemunho de vida e escolhas!

    • Que importante ler isso Lilian!! Fico feliz que tenha te tocado positivamente ❤️🙏 Gratidão!!

  • Parabéns!!!
    Que felicidade ler seu depoimento e as fotos da Li 😍

    Conte conosco
    Abs

    • Gratidão por contribuirem com os registros incríveis da nossa história! 📸💕🙏

  • Parabéns Dani!!! Lindo relato!!! Muita saúde e sucesso na sua vida!!! Beijão!!

  • Chorei a cada trechinho! Quanto amor!!!
    Como digo, desde o dia que percebi sua vocação por essa área, você descobriu o seu dom, você se redescobriu enquanto mulher que agora assume a linda missão de redescobrir outras mulheres! Pode ter certeza que se um dia eu puder ter a graça de me tornar mãe, quero uma profissional como você ao meu lado e isso a gente só descobre com relatos como o seu! Parabéns por tudo isso, por nos humanizar com tanta experiência linda! Você ainda tem muito a brilhar nessa área, a sua área! Você nasceu pra isso amiga! ♥️

    • Aaahh Deh...Chorei com cada palavrinha sua também, vc acompanhou esse sonho crescendo e agradeço por me dar tanta força sempre! Obrigada por nos humanizar com seu lindo trabalho também! 😍💕🙏

  • Lindo e emocionante relato... Parabéns e que Deus esteja sempre a frente de tudo!!

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