A maternidade chegou em minha vida quando tudo já estava basicamente estruturado: casa própria, carro e emprego estável. Foi uma gestação planejada e desejada, porém com poucas informações sobre nascimento, puerpério, aleitamento materno e etc. Então, meu primeiro filho nasceu e mergulhei na intensidade do que é ser mãe. Tive medo, muito medo de ser mãe novamente porque eu sabia que isso significaria mais um tempo de pausa nos meus projetos pessoais. Mas aí aconteceu a segunda gestação e, com ela, conheci de fato o que seria o maior projeto dos meus próximo dias.
No final de 2014, embarquei em um sonho pessoal ainda não realizado no auge dos meus 35 anos: viver um tempo fora do país. Desde a adolescência, eu tentara seduzir meus pais a me proporcionarem um intercâmbio para aprender o inglês e, como naquela época não foi possível, convenci meu marido (tarefa que não foi nada difícil), junto com nosso pequeno filho, a partirmos rumo ao Canadá.
A experiência foi intensa, o país tem uma cultura incrível, mas a que mais despertou meu interesse foi a política de atendimento à saúde da mulher. Foi lá que ouvi falar em “midwives”, conhecidas por nós como parteiras, realidade ainda incipiente no Brasil, porém rotineira naquele país. Vivendo um sonho de adolescente, acabamos caindo numa situação comum desta etapa do desenvolvimento: uma gravidez não-planejada. Desespero! Grávida, estrangeira, comunicação difícil, ameaça ao futuro de nosso projeto por lá. O que poderia me salvar, dar um novo sentido a tudo isso, segurar o medo de uma depressão pós-parto diante de uma notícia inesperada como esta?
O contato com elas, as “midwives”, representou a abertura de um mundo gigante para mim, lindo, pleno de sentido, ressignificando o meu medo de ser mãe novamente, de forma que eu não sentisse as conquistas se perdendo, mas sim sendo redirecionadas para um novo olhar. As profissionais guiaram-me com informações adequadas, amenizaram minhas culpabilizações e desmistificaram conceitos tabus no processo de nascimento tão arraigados em nossa cultura brasileira. A notícia mais gratificante foi saber que minha tentativa de parto normal seria tranquilamente viável mesmo após uma cesárea prévia.
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No Brasil, conforme Melania Amorim esclarece, muitas mulheres sentem-se inseguras em tomar a decisão de tentar um parto normal após uma cesareana devido à falta de esclarecimento fornecida por profissionais da saúde pertinentes a este assunto. Em vez de encorajá-las com dados objetivos, as gestantes acabam por receber mensagens como: “você poderia ter colocado seu bebê em risco” ou “seu útero poderia ter se rompido”. Vaginal Birth After Cesarean (VBAC), termo ao qual fui apresentada na minha aventura canadense, fez muito sentido para eu me empoderar e enfrentar o sistema cesarista do Brasil. Mas como enfrentar uma tentativa de parto normal em um país que encara o nascimento por esta via permeado de impossibilidades e de coisas que podem dar erradas? “Prazer, eu sou a doula e estou aqui para te apoiar!”
Em solo brasileiro, ainda grávida (sim, decidimos ter o baby aqui), recebi a missão de encontrar um profissional que respeitasse minha decisão de tentar o parto normal, tendo sido alertada para os altos indíceis brasileiros de cesareana. Lembro como se fosse hoje das palavras de minha parteira: “eles vão querer te convencer que não pode ter um parto normal porque você tem uma cirurgia prévia.” Missão dada, missão cumprida! Tive a grata surpresa de saber que, próximo de minha cidade, o movimento da humanização bombava e, junto com uma médica pra lá de humana, escolhi uma doula para mim.
O Ministério da Saúde reconhece a participação da doula como um instrumento humanizador, uma vez que ela acolhe e acompanha as mulheres na hora do parto, oferecendo apoio emocional e incentivo às gestantes e seus familiares. Para além disto, a presença da doula favorece sensação de bem estar para a mulher, oferecendo alívio não-farmacológico da dor, reduzindo a necessidade do uso de analgesia e promovendo uma vivência positiva na transformação de seu papel como mãe.
O apoio da doula no meu processo gestacional foi decisivo para eu acreditar na minha capacidade de parir e, sem dúvida alguma, superou minhas expectativas iniciais, pois complementou meus conhecimentos com informações as quais não tivera acesso até ali. Apresentou-me textos baseados em evidências científicas, me apontou a viabilidade de eu ter, para além de um parto normal, uma vivência natural de nascimento, sem intervenções desnecessárias.
Após um surpreendente parto tsunâmico, incrível, respeitoso e amoroso, mergulhei num puerpério mais ocitocinada, entregue àquela relação da qual tinha tanto medo e com uma compreensão muito mais clara de que aquele processo fora essencial para eu estabelecer um vínculo saudável e próximo com meu filho. E, então, também aceitei que projetos não planejados podem abrir portas, janelas e corações de um jeito imprevisível, mas escancaradamente apaixonante!
Vivenciar um nascimento em ambiente humanizado, acolhedor e respeitoso pode transformar a experiência de maternagem na vida da mulher em um momento inesquecivelmente importante. Hoje, minha realização pessoal é apoiar futuras mães, dando suporte emocional e técnico sobre os aspectos envolvidos na maternidade para que esta vivência seja mais leve e mais calma.
See you!
Camile da Rosa
Referências Bibliográficas
VBAC
http://estudamelania.blogspot.com/2012/08/estudando-vbac-metassintese-das.html
Doulas e parteiras
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Ual!!!!
Parabéns Camile! Linda vivência. Beijos e sucesso.
Obrigada, querida! Beijos
Que relato incrível, Camile!!! Experiência realmente transformadora! Te admirando aqui de longe! Sucesso sempre!👏🏻😘
Obrigada pelo carinho! Beijos com muitas saudades!
Parabéns, filha, pela clareza e conteúdo do artigo. Tua perseverança trará uma nova percepção sobre o parto humanizado.
Obrigada, pai! Apenas sigo os bons exemplos que tive na minha vida! Beijos com amor!
Lindo depoimento Cá, parabéns minha amiga querida por megulhar fundo nesta complexa experiência que é a maternidade. Sucesso na tua caminhada e que siga fortalecendo as mulheres e promovendo ambientes seguros e protegidos no momento mais importante que é a nossa chegada neste mundão. Beijos, Lê
Obrigada amiga querida! Saudades