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E.T.: A mulher da família que quer um parto normal

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“Não adianta, nós não temos dilatação” , “Nossa bacia é estreita”, “Você não vai aguentar a dor”, ” Tem que ter muita força”, ” Sua vagina nunca mais vai voltar ao normal”, “Cesárea é muito mais prático!”

Com que frequência você escuta essas frases?

Acervo YouTube

E se a sua resposta foi: A TODO MOMENTO.

Bem-vinda ao mundo extraterrestre das únicas que escolheram passar por um parto normal em uma família de nascimentos por cesarianas! 

Mãe, tias, primas, irmãs, amigas, cunhadas e concunhadas fizeram a cesárea. E só você quer um parto vaginal. Sei que muitas vezes você se vê perdida em relação a sua escolha, totalmente sem saída, sem apoio algum. O obstetra da família tão renomado e cheio de indicações só faz cesáreas. Você não sabe bem para onde correr, e se é mesmo a melhor escolha.

Crescemos, muitas vezes, acreditando que as gestações são acompanhadas por gerações. Que a justificativa que impediu as mulheres da família de terem um parto normal será a mesma para você. Entenda, o caminho que você está trilhando com entusiasmo e em busca de informação, valerá a pena em todo o seu processo de parto e pós-parto.  Que barriga alta, falta de dilatação, ou bacia estreita não são motivos para que você não viva o parto normal. 

TODOS QUEREM A CESÁREA

Acervo Wikimedia Commons

Se você nasceu por volta da década de 80/90 é muito provável que a sua avó tenha tido a sua mãe em um parto domiciliar com mulheres em torno. Na história do parto as mulheres eram responsáveis e obtinham o saber empírico sobre o universo da gestação, parto e pós-parto.

 

Era um evento que estava somente sob o controle do conhecimento e da prática feminina.

Com o decorrer do tempo, o avanço da tecnologia e os estudos voltados a obstetrícia, trouxeram os homens para ocuparem esses espaços. As técnicas desenvolvidas para salvarem a vida de parturientes e recém nascidos colocou o parto na caixinha da medicalização. Atribuiu-se aos médicos e obstetras a responsabilidade e o poder dominante em evitar riscos. 

Os partos passaram a acontecer nos hospitais. Técnicas começaram a ser utilizadas de forma rotineira, e a obstetrícia, sob tutela cirúrgica,  começou a se desenvolver com nascimentos pouco voltados à mulher. Os homens adentraram esse universo como capacitores e facilitadores do processo do nascimento. O alto índice de cesáreas em nosso país teve a sua origem nessa institucionalização do parto.

 A recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) é que somente 15% dos nascimentos sejam realizados por meio de cesariana. A pesquisa Nascer no Brasil revela que 52% dos nascimentos são realizados através do procedimento cirúrgico em nosso país, chegando a taxa de 88% no setor privado. Essa epidemia da cesárea trouxe então alguns padrões de comportamento, crenças e valores transmitidos.

Houve uma naturalização do processo cirúrgico como forma de nascimento. As pessoas começaram a se sentir mais seguras com a cesariana como tipo de parto. A equipe médica e a instituição obtinham maior ou total controle sobre a situação. E então, mesmo que com transformações tão rápidas, o protagonismo da mulher no momento do parto foi sendo deixado de lado. A responsabilidade, o envolvimento emocional, e a valorização do parto foi concedida à equipe médica. 

Todo esse combo de comportamentos e costumes foram, aos poucos, passados para próximas linhagens da família. E hoje, além de buscarmos informações e lutarmos pela humanização da assistência ao parto, também precisamos começar a problematizar as crenças transmitidas de geração em geração sobre gestação e parto.

Um estudo realizado pela Unicamp (1982) com obstetras e especialistas brasileiros, identificou alguns fatores socioculturais determinantes para a escolha das mulheres pela cirurgia cesariana. O primeiro motivo encontrado foi o medo da dor durante o trabalho de parto e parto. O segundo foi o conceito de que a cirurgia mantêm intacta a fisiologia e anatomia da vagina e do períneo. E o terceiro e último fator cultural é a crença de que o parto vaginal é mais arriscado para a mulher e para o  feto do que uma cesariana. 

Desta forma, todo esse retorno geracional em relação ao processo do parto é baseado em um histórico de crenças populares limitantes, sem que haja uma atualização na difusão dessas informações. 

A influência familiar na gestação e parto da mulher tem um peso significativo nas suas escolhas. Uma cesariana nunca é uma opção apenas da mulher, é ainda compartilhada entre a mulher, família e médico. Enquanto, quando se decide por um  parto vaginal, na maioria das vezes, a gestante se encontra sozinha para sustentar suas vontades.

O estudo Nascer no Brasil aponta que quase 70% das brasileiras deseja um parto normal no início da gravidez. Entretanto, poucas foram apoiadas em sua preferência pelo parto normal: nos serviços privados, esse valor foi de apenas 15% para aquelas que estavam em sua primeira gestação. “Há certamente uma influência do pré-natal na decisão das mulheres pelo tipo de parto, mas as amigas e os familiares também influenciam. Não se pode, entretanto, deixar de destacar que é uma visão equivocada achar que a cesariana é a forma mais segura para parir”, explica Maria do Carmo.

Por isso, enquanto todos os estudos atualizados nesse cenário do parto não são transmitidos até que se construa uma nova identidade, é importante que a mulher busque informações e se coloque como protagonista de sua gestação e parto.

EU, EU MESMA, E MEU PARTO!

É certo que vivemos em uma cultura da cesariana que foi sendo construída socialmente. Com isso,  muitas vezes temos de lidar com opiniões e palpites sobre nossas escolhas em relação ao parto. E em sua maioria são pessoas queridas querendo nos “ajudar”.

Então aqui vão CINCO DICAS importantes que podem te ajudar a lidar com essas primeiras intervenções do seu parto!

1- FRASES AFIRMATIVAS

Quando qualquer dúvida bater pelas influências externas; respire fundo, feche os olhos e repita:

“Eu posso”, “Meu corpo é sábio” “Meu corpo dará a luz em seu tempo” “Meu trabalho é simplesmente relaxar e permitir que o parto aconteça” 

Crie as suas próprias afirmações, que se encaixam melhor na sua história e nos seus propósitos!

2 – FINJA QUE NÃO ENTENDEU NADA!

Sempre que chegar a vizinha ou a tia querendo contar as histórias tristes e traumáticas da família FINJA DESENTENDER E TRANSFORME O ASSUNTO! 

Ou apenas saia andando para qualquer lado mesmo… 

3 –  BUSQUE INFORMAÇÃO

Já sabemos que toda essa influência familiar pela escolha do parto vem de padrões culturais baseados em crenças populares. Por isso, para que se tenha respostas na ponta da língua, ou apenas para benefício próprio, SE INFORME!

Cesárea não significa ausência de dor, e parto normal pode acontecer sim, com pouca, ou nenhuma dor!

Prazer sexual e anatomia da vagina independem do tipo de parto!

Segurança do parto normal e os perigos da cesárea eletiva

4 –  BUSQUE APOIO FORA DO CÍRCULO FAMILIAR

Você já percebeu que ninguém te apoia dentro desse espaço familiar, não é mesmo? Então não deixe de buscar seu apoio e acolhimento fora desse círculo!

Tenha uma doula

Converse com amigas e conhecidas que passaram pelo parto

Vá em rodas de gestantes e parto

5 – PACIÊNCIA E TRANQUILIDADE

Você é o E.T. de hoje, mas pode ser a normal de amanhã!

Caminhamos para a retomada do controle da mulher sobre o seu próprio corpo no processo da gestação e parto, e você pode ser a sementinha plantada nas mulheres da família.

Acredite sempre em você. Autoconfiança, mulher!

Passe o ar sobre o seu total domínio da situação

E saiba que, em certos momentos da vida, todo mundo se arrisca no diferente.

Parir é resistir!

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Referências

REVISÃO. Medicalização x Humanização: O cuidado ao parto na história. UERJ. 2005

FAÚNDES.A; CECATTI.J.G. A operação Cesárea no Brasil. Incidência, tendências, causas, consequências e propostas de ação.  Cadernos de Saúde Pública, 1991.

MORAES,M.S; GOLDENBERG,P. Cesáreas: um perfil epidêmico. Cad. Saúde Pública, 2001.

CAMARA, M;MEDEIROS,M;BARBOSA,M.A. Fatores Socioculturais que influenciam a alta incidência de cesáreas e os vazios da assistência de enfermagem.  Rev. Eletrônica de Enfermagem, 2000

NAKANO, A.R; BONAN,C;TEIXEIRA,L.A.A normalização da cesárea como modo de nascer: cultura material do parto em maternidades privadas no Sudeste do Brasil. Rev. de Saúde Coletiva, 2015

Fatores determinantes para a preferência da mulher pela cesariana. Contex. Enfermagem, 2015

FIOCRUZ. Nascer no Brasil: pesquisa revela número excessivo de cesarianas. 2014

BRENES,A.C. História da parturição no Brasil, Século XIX. Cad. de Saúde Pública, 1991

 

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Doula Ana Clara (Natal - RN)

Jornalista, instrutora de yoga para gestantes, Doula, e mãe da Lisbela que veio ao mundo em 2018 após uma cesárea intraparto.

(Re)nasci doula em 2017, quando fiz o curso de formação para lidar com a gravidez recente e encarar o luto de uma perda gestacional anterior.  Acredito no poder da mulher sobre seu corpo e seu parto, e sigo no caminho pela humanização da assistência à gestantes e parturientes.

Ofereço acompanhamentos durante o período perinatal (antes e depois do nascimento), práticas de consciência sobre seu corpo e a si mesma através do yoga, suporte físico e emocional no parto.

Cidades de atuação: Natal -RN Instagram: @doulaanaclara Facebook: @doulaanaclarafonseca Contato: (16) 99307 -5061 / doulaanaclarafonseca@gmail.com

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