Quando um bebê nasce inúmeras dúvidas nascem junto. Ele normalmente passa por diversos procedimentos no hospital e nem sempre os pais estão cientes do que e por que está sendo feito.
É fato que muitos procedimentos já têm novas recomendações, especialmente para evitar o uso rotineiro, fazendo uma avaliação individual da necessidade de sua realização, porém, em muitas maternidades brasileiras, ainda perpetuam muitas práticas já ultrapassadas e, até mesmo, não recomendadas.
Na elaboração do plano de parto muitas delas aparecem e os pais ficam em dúvida das reais indicações ou não, então vamos falar de uma delas neste texto.
Nesse post você vai encontrar
Se você nunca ouviu falar em Hipoglicemia,
existe uma grande chance que se
tiver um bebê vai ouvir este termo no hospital. Parece haver um pavor dos profissionais, muitas vezes transmitido às famílias de que o bebê apresente essa condição. E o que é isso?
Hipoglicemia nada mais é do que uma diminuição da quantidade normal de açúcar no sangue. Uma queda real e persistente de açúcar pode causar diversos problemas sendo, o mais grave, uma dificuldade da função cerebral, podendo ocorrer lesões devido à falta de energia para o adequado funcionamento.
A hipoglicemia pode acontecer com qualquer bebê, porém existem fatores de risco para seu aparecimento: mãe diabética, bebê PIG (pequeno para a idade gestacional), prematuros, filhos de mães subnutridas, dentre outros.
O começo da prevenção de problemas sempre começa por um bom acompanhamento pré-natal que poderá permitir uma gestação mais saudável e tranquila. Além disso, uma boa assistência durante o nascimento do bebê favorece à melhor adaptação fora do útero.
Assim que o bebê nasce, algumas práticas melhoram consideravelmente o prognóstico neonatal no que diz respeito à diminuição do risco de hipoglicemia: contato imediato pele a pele, amamentação na primeira hora de vida, alojamento conjunto mãe e bebê são os principais exemplos e mais fáceis de serem adotados. Essas mesmas práticas contribuem fortemente para a redução da mortalidade infantil e para o sucesso na amamentação.
Infelizmente em muitos hospitais ainda prevalecem práticas protocolares que separam mães e bebês em seus primeiros momentos de vida, seja para avaliações e procedimentos, seja bebês que são mantidos em berçários para monitoramento, o que prejudica o estabelecimento da amamentação, que é um grande fator de proteção para a hipoglicemia.
Ao adotar essas práticas prejudiciais, é possível que ocorra uma hipoglicemia iatrogênica e, ou para corrigir este fato, ou mesmo na intenção de prevenir a hipoglicemia, algumas instituições oferecem água glicosada ou leite artificial para os bebês.
De acordo com Toma e Rea (2008):
“A preocupação com a hipoglicemia neonatal logo após o parto tem sido responsável por interrupção do aleitamento materno exclusivo em muitos hospitais devido ao uso de soro glicosado em recém-nascidos. No entanto, a hipoglicemia parece ser comum entre os mamíferos como um processo adaptativo e autolimitado, na medida em que os níveis de glicose acabam por aumentar espontaneamente em poucas horas. A amamentação precoce e exclusiva atende às necessidades dos recém-nascidos a termo, por isto desaconselha-se o uso de soro glicosado, água ou fórmula infantil que podem interferir no estabelecimento da amamentação e nos mecanismos metabólicos compensatórios do bebê. Recomenda-se que o monitoramento dos níveis glicêmicos seja realizado apenas nos recém-nascidos de risco ou com sintomas clínicos de hipoglicemia, uma vez que os exames de rotina em bebês saudáveis podem interferir negativamente na relação mãe/bebê e na amamentação.”
O bebês nascem normalmente cansados. Ou eles passaram por um processo de trabalho de parto que é naturalmente cansativo e estressante (e isso tem uma função de preparação para a vida extrauterina) ou eles nasceram por uma cirurgia que também tem sua carga de estresse e não permite toda a preparação e adaptabilidade de um parto vaginal. De qualquer forma, é comum que esse bebê, algum tempo após nascer, sinta necessidade de dormir para repor as energias. Por essa razão, é comum uma hipoglicemia fisiológica ocorrer que não precisa de nenhuma intervenção tendo em vista que, em geral, o organismo será capaz de reequilibrar a glicose. Porém, para que isso aconteça é preciso que o bebê possa estabelecer rapidamente a amamentação, com o contato pele a pele e estímulo da ocitocina, permitindo, assim, a auto regulação.
Além disso, o uso desses alimentos chamados pré-lácteos (água glicosada e fórmula infantil ou leite artificial) podem causar lesões no intestino do recém-nascido que ainda é imaturo e não está preparado para a absorção e digestão correta desses alimentos.
Outro grande fator é a dosagem que a forma como esses alimentos pré-lácteos podem ser oferecidos ao bebê. Em caso de real necessidade de suplementação alimentar isso deveria ser feito utilizando colher ou copinho, no entanto, ainda é comum os bebês receberem esses alimentos com o uso de uma chuquinha (pequena mamadeira para recém-nascidos).
Neste caso temos outro fator que pode comprometer o aleitamento materno: a chamada confusão de bicos! Ou seja, o bebê recebe um alimento por meio de um bico artificial antes mesmo de ter aprendido a mamar corretamente no seio materno. Ao ser levado à mama, não consegue/não sabe como fazer a ordenha correta uma vez que o alimento da mamadeira sai muito mais facilmente, além de movimentar e estimular diferentemente os músculos oro-faciais. Isso causa irritabilidade no bebê que não consegue satisfazer sua fome, levando à nova complementação alimentar, o que gera um círculo vicioso prejudicial à amamentação.
Somado a isso, é comum ao ser ofertado o leite artificial a pessoa responsável diluir e oferecer ao bebê a dosagem mínima da medida do fabricante (em geral, 30 ml). Contudo, o estômago de um recém-nascido está preparado para receber cerca de 5 a 8 ml de leite. Assim, o estômago do bebê pode ficar dilatado, fazendo com que, ao ser levado ao seio materno, ele apresente uma demanda muito maior do que a demanda que o corpo da mãe está preparado para sanar. Novamente podemos ter o problema da dificuldade de saciedade, irritabilidade e o início do círculo vicioso que compromete o aleitamento materno.
Diversos estudos constataram haver ainda uma falta de atualização e adaptação dos serviços de saúde para boas, melhores e atuais práticas nos cuidados com os bebês recém-nascidos. Muitas vezes a desatualização ou mesmo a sobrecarga de trabalho/falta de profissionais e o receio de riscos aumentados de problemas com os bebês podem levar as equipes a adotarem práticas que causam problemas iatrogênicos, ou seja, problemas que acabam sendo causados pela má prática dos profissionais da assistência materno-infantil.
Por isso, é importante que os pais estejam atentos às reais necessidades de suplementação e, caso seja realmente necessária, à correta realização da mesma.
Quer saber mais a respeito? Confira abaixo alguns estudos que serviram de base para este texto:
Avaliação Do Aleitamento Materno Em Crianças Atendidas Pela Unidade Básica De Saúde São Sebastião Em Juiz De Fora – MG. http://www.ufjf.br/nates/files/2009/12/Aleitamento.pdf
Benefícios da Amamentação para a Saúde da Mulher e da Criança: um Ensaio sobre as Evidências. https://www.scielosp.org/scielo.php?pid=S0102-311X2008001400009&script=sci_arttext
Fatores Associados à introdução precoce de leite artificial, Município do Rio de Janeiro, 2007. https://www.scielosp.org/scielo.php?pid=S1415-790X2009000300013&script=sci_arttext&tlng=pt
Avaliação da Assistência ao Parto em Maternidade Terciária do interior do Estado de São Paulo, Brasil. https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/11947/S1519-38292009000100007.pdf?sequence=1&isAllowed=y
Prevalência Do Aleitamento Materno Nos Primeiros Seis Meses De Vida. http://saudeinfantil.asic.pt/images/download-arquivo/1998%20-%203%20-%20Dezembro%20-%2020/rsi-1998-dezembro.pdf#page=55
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