A grande pesquisa realizada pela Fiocruz, Nascer no Brasil , constatou o que nós do movimento de humanização percebemos todos os dias: 1 em 4 mulheres são vítimas da Violência Obstétrica.
Por definição “entende-se por violência obstétrica qualquer ato exercido por profissionais da saúde no que cerne ao corpo e aos processos reprodutivos das mulheres, exprimido através de uma atenção desumanizada, abuso de ações intervencionistas, medicalização e a transformação patológica dos processos de parturição fisiológicos”, (JUAREZ et al; 2012).
Essas são algumas das Violências Obstétricas mais comuns:
• Jejum forçado;
• Isolar a mulher e não permitir acompanhante;
• Restringir a gestante ao leito, para que não se movimente;
• Amarrar a mulher à cama;
• Utilizar meios farmacológicos sem autorização;
• Induzir o parto;
• Episiotomia (corte entre a vagina e o ânus para facilitar a passagem do bebê);
• Manobra de kristeller (quando a barriga é empurrada por enfermeiras);
• Não deixar que a mulher grite ou converse;
• Agressões e humilhações verbais: “Se você não me obedecer, saio daqui e você vai ter o bebê sozinha”; “Na hora de fazer, não doeu”; “Se você não ajudar, seu bebê vai morrer”.
Quando falamos em Humanização do Nascimento estamos nos baseando em um importante tripé:
1) A Mulher deve ser protagonista do processo. Protagonismo significa dar informação verdadeira, deixar a mulher “decidir” verdadeiramente a partir de informações com bases científicas. Orientar e explicar todos os procedimentos, exames, resultados, condutas com a mulher e seu acompanhante. Não é levar a mulher decidir baseado em suas crenças pessoais. Só para exemplificar: recentemente ouvi o relato de uma mulher que teve seu primeiro parto natural com uma equipe humanizada e na segunda gestação, porque seu bebê estava pélvico (sentado), ela foi levada a ter uma cesárea já que o médico não realizava nem a Versão Externa Cefálica (manobra mecânica feita pelo médico obstetra para virar o bebê), nem acompanhava parto pélvico. Qual deveria ter sido a conduta? Indicar artigos, indicar profissionais habituados a esse parto e construir a decisão com a mulher. O mesmo acontece com profissionais que ao longo da gestação constróem a “cesárea” da mulher com frases: seu bebê é grande ou pequeno; sua bacia é estreita, seu bebê está alto (sendo que o bebê só desce em trabalho de parto).
2) As condutas dos profissionais durante a gestação, parto e pós parto devem ser baseadas em evidências científicas atualizadas. Ou seja, discutir e informar porque se está fazendo esse ou aquele exame e o que será feito com o resultado; não realizar, por exemplo, exame de toque sem necessidade assim mesmo como ultrassonografia. Durante o parto oferecer a possibilidade de métodos de alivio natural da dor, incluindo a liberdade da mulher em ter, além do seu acompanhante, uma doula de sua escolha; não realizar procedimentos já considerados desnecessários, o que caracteriza violência obstétrica, como manobra de Kristeller.
3) Equipe multidisciplinar. Por que chegamos no Brasil a esse absurdo índice de cesáreas e partos violentos? Uma das causas é o “medicocentrismo”. Culturalmente temos uma crença no saber médico, sem imaginar que muitas condutas, diagnósticos são precários por não levarem em consideração o histórico do paciente, não haver uma boa escuta e questões mercadológicas que excluem os aspectos emocionais tão pertinentes, principalmente nas questões obstétricas. Em muitos países com resultados perinatais ideais (ou próximos deles), gestantes de baixo risco são atendidas por Obstetrizes (ou midwifes). No Brasil existe apenas uma faculdade com a formação semelhante a internacional. Uma enfermeira, para se tornar enfermeira obstétrica, deve fazer uma faculdade de enfermagem e em seguida se especializar nas questões das mulheres e dos bebês. Na Inglaterra, por exemplo, uma mulher ao engravidar se dirige ao posto de saúde mais próximo e começa a ser atendida por uma Midwife. Ao longo da gestação ela conhecerá várias enfermeiras daquela equipe e será acompanhada por duas delas, seja em casa, na casa de parto. Caso a gestação saia dos parâmetros da normalidade, ela é encaminhada para um médico responsável que seguirá o pré-natal dela (concomitante com a Midwife). E o parto, neste caso, acontece em ambiente Hospitalar, tendo o pediatra também como parte da equipe. Idealmente uma gestante de baixo risco pode fazer seu pre-natal com uma Enfermeira Obstetra ou Obstetriz, ter um médico humanizado na retaguarda, acompanhamento de uma doula de sua escolha (a Doula não é da equipe, ok?). No caso de uma gestação fora do risco habitual, um pediatra com uma conduta humanizada que não submete um bebê (mesmo prematuro, mesmo nascido de cesárea) a procedimentos desnecessários que são apenas parte de rotinas hospitalares. Bebês que nascem bem não precisam sair do colo da mãe, não precisam ser sugado (seja aspiração ou uso da perinha), nem pesados, medidos, esfregados. Colo da mãe, possibilidade da amamentação na primeira hora vai minimizar os danos de colonização por bactérias que o bebê nascido de cesárea não pode viver. Sim, as bactérias da mãe são a primeira “vacina” do bebê. Já se sabe que a cesariana está associada a obesidade, diabetes, asma (isso é pauta para outro artigo). Em resumo: uma gestante de baixo risco precisa de 2 parteiras no meomento do parto (que pode ser em casa ou casa de parto) e uma doula de sua escolha. Médico e pediatra são apenas para retaguarda no casa da necessidade de intervenções hospitalares (indução, analgesia, forceps, ocitocina, cesárea)
Então vamos lá para as dicas de como evitar a Violência Obstétrica.
1) Engajar em Grupos do Facebook bacanas que discutam parto. Indico Cesárea Não Obrigada e Parto Natural. Leia os posts, faça buscas nesses grupos que tem muita informação já discutida por lá.
2) Assista aos Filmes Renascimento do Parto e Nascendo no Brasil. No Renascimento do parto tem o link para comprar o filme porque foi um filme financiado e a compra ajuda as próximas edições que estão prontas para irem neste ano no ar no cinema. Esses filmes ajudam a entender a realidade obstétrica brasileira.
3) Engaje-se em Grupos de Apoio de sua cidade. Em geral nesses ambientes você conhece Doulas que são a entrada e o Guia do mundo da humanização.
4) Contrate uma Doula experiente. Existem as Doulas do plantão, as Doulas de Equipes, as Doulas Voluntárias. Mas não é a mesma coisa de quem trabalha com isso. Não sendo possível você precisa preparar MUITO BEM seu acompanhante.
5) Faça seu plano de parto
6) Conheça as maternidades e procure saber quais procedimentos são rotineiros baseados em seu plano de parto. Em geral as maternidades privadas são “menos humanizadas” do que o SUS.
7) Contrate uma Equipe Humanizada. Lembre-se: a doula é escolha da MULHER.
Tenha em mãos impressa a Lei do Acompanhante e saiba se em sua cidade já está em vigor a Lei da Doula.
Por aqui tem muita informação para você construir um parto real dentro de suas possibilidades e conhecer bem o cenário brasileiro para se proteger da violência, que infelizmente, ainda está naturalizada na nossa assistência obstétrica.
Para saber mais: https://www.artemis.org.br/violencia-obstetrica?gclid=CjwKCAiAoNTUBRBUEiwAWje2lqLDL4foPej5-AVcbAsElzO6rO1-8sy7BVeQNJISVffj_1_8aq97-xoClrYQAvD_BwE
Em São Paulo , existe alguma lei para ajudar, as mulheres que sofreram violência obstétrica?